A Copa Deles

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Agosto é o mês do desgosto aqui e ali em vários cantos do globo terrestre. Na Argentina, não se aconselha lavar os cabelos no mês de Agosto – os desobedientes, dizem, estão chamando a morte para um brinde, imagino, ao som de Por una Cabeza e Adiós Muchachos, na voz de Carlos Gardel. Foi em Agosto que o Muro da Vergonha, em Berlim, começou a ser construído. E será em Agosto deste ano a Reunião Geral Anual da ITF. Qualquer semelhança entre estes acontecimentos Augustus não é mera coincidência.

Nesta reunião de cúpula da ITF haverá uma votação para ratificar se a Copa Davis deixará de ser a Copa Davis em corpo e alma, ao menos, para os fãs do Tênis e da competição. Isto porque a diretoria da ITF aprovou um plano de negócios da empresa Kosmos – que de beleza e harmonia conserva só o significado do nome mesmo – propondo transformar o Grupo Mundial da Copa Davis em uma competição de apenas uma semana, envolvendo 18 países em fase de grupos, e playoffs a partir das quartas de final, cujos jogos serão disputados em melhor de 3 sets, em sede única, a partir de 2019 até 2044 (contrato Bodas de Prata), em todo mês de Novembro – neste mesmo mês, em 1945, falecia o fundador da Davis, Dwight Filley Davis. Que ironia!

O jogador de futebol, Gerard Piqué, do Barcelona, é o fundador e presidente da Kosmos. É óbvio que por trás de toda esta insanidade esportiva e malícia comercial haveria de ter um sofasista. Se ele não consegue ter argumentos plausíveis nem para se posicionar a favor da separação da Catalunha por que haveria de ter para se posicionar a favor de um projeto que arruina as principais característica da mais tradicional competição entre países no Tênis?! Será que ele tem usado um shortinho colado, de bumbum guloso, para ensaiar com a Shakira a música Loca? Só pode.

O ATP Finals que reúne os oito melhores jogadores do ranking mundial de Tênis acontece anualmente em meados de Novembro e, no final deste mês, a final da Copa Davis. O presidente da ITF, David Haggerty, argumenta que as mudanças trarão os principais nomes do Tênis de volta à competição. Só se for por dinheiro, já que, o dinheiro a ser investido em premiações só perderia atualmente para o USOpen. A principal desculpa dos grandes nomes do Tênis ao não participarem da Copa Davis no formato atual é o calendário. Ora, uma competição envolvendo 18 países a ser disputada em uma semana, no final da temporada, não me parece a solução para as estrelas. Em 2014, por exemplo, Roger Federer não disputou a final do ATP Finals alegando um problema físico, limitação que poderia prejudicar sua performance na final da Copa Davis. Não é incomum acompanharmos outros tenistas com problemas físicos desistindo de disputar o Finals próximo da data do torneio ou limitados fisicamente na própria competição. Será que uma nova Copa Davis com o formato sugerido e com tanto dinheiro injetado não traria mais baixas ao Finals?!

O confronto Brasil x Alemanha de 1992, pela Copa Davis, é uma das minhas lembranças crème brûlée tenísticas. Alguns céticos e outros pessimistas dirão que minhas memórias pueris são romanceadas. Azar o deles, enquanto o meu coração se inunda de endorfina o deles se afoga no cortisol. No alto dos meus onze anos de idade e de férias na casa dos meus avós, no Rio de Janeiro, me pareceu um sonho o convite do meu pai para que eu e meus irmãos fôssemos ao Shopping assistir um torneio de Tênis – na montanha russa do Tivoli Park da Lagoa é que eu não iria. Naquela época eu era fã do Jaime Oncins e do Pete Sampras, então, pense na felicidade de uma criança que poderia ver o Oncins e o mala freguês do Sampras, Boris Becker, em um mesmo evento. A realidade só tocou os meus pés na arquibancada, onde a torcida emendava cantos de incentivo, enquanto comia biscoitos Globo e bebia mate. Pensem num cabra ruim. Não, não pensem. Naquela equipe do Brasil não tinha cabra ruim. Mattar encarou Becker como um homem que defende seu país e sua honra. Só sucumbiu no quinto set, não por falta de garra. Oncins tratou de empatar o confronto contra Steeb. Nas duplas, os exímios duplistas Motta e Roese fizeram a dupla adversária parecer amadora. Becker saiu de quadra com cara de maracujá pendurado num galho de goiabeira – a inclinação do Becker pelo pôquer deve ter surgido ali. No domingo, último dia de confronto, tudo o que é de emoção e adversidade em Davis, pôde acontecer. Já fui em muitos eventos de Tênis, de challenger a GS, mas nenhum tem a aura da Davis – “que me perdoem os ‘feios’, mas beleza é fundamental”.

A torcida, o fator casa, fazem desta competição ímpar – para mim, de mãos dadas com confrontos em melhor de 5 sets, esta é a maior essência da Davis. A equipe da casa precisa lidar com a pressão da vitória, com as expectativas da torcida e de si, em piso e condições que ela mesma propôs. A equipe visitante precisa lidar com a pressão da derrota, jogar em condições que, geralmente, lhe são menos favoráveis, precisa superar tudo e todos e não apenas o adversário do outro lado da rede. A ideia da Kosmos com o aval de Haggerty é realizar a competição em país “neutro” e em piso ainda não revelado. Destaco a palavra neutro porque não existiria sede neutra caso um dos 18 países classificados seja a deste país sede. Neste caso, teríamos dois problemas. O primeiro: se a equipe deste país sede se classificar todo ano, teremos todo ano a mesma torcida beneficiando apenas este país, e no caso de eliminação deste país antes da final, na sequência de jogos teríamos uma torcida que não torce por uma nação, intrínseca à Davis, mas pelo país do seu jogador predileto. O segundo: se a equipe deste país sede não se classificar, teríamos uma arquibancada totalmente sem identidade, torcendo pelo seu jogador predileto em cada partida. O perfil deste público se assemelharia ou se igualaria ao perfil do público dos outros torneios de Tênis. Ou seja, a torcida da Davis, como existe hoje, estaria enterrada. Não há como um jogador de futebol, que nunca disputou uma Copa do Mundo em seu próprio país, entender isto. Ainda mais com tanto dinheiro regendo o vendaval.

David Haggerty afirma: “Esta nova parceria não apenas criará uma verdadeira Copa do Mundo de Tênis, mas também trará níveis recorde de novos investimentos”. Nível recorde de novos investimentos?! Será que a longo prazo, um contrato de Bodas de Prata, 25 anos!, vale mesmo a pena para ambos lados? A Davis sempre foi uma competição de lotar arenas, bolsos e cofres. Se falta novos investimentos é por falta de habilidade, conhecimento de mercado financeiro e marketing por parte da diretoria da ITF. Uma empresa que pretende investir bilhões sabe que arrecadará muito mais que estes bilhões. Verdadeira Copa do Mundo de Tênis?! Bom, segundo o dicionário o sinônimo de verdadeira é genuína, fiel, leal. E pelo pouco que exemplifiquei aqui, não precisa ter mais que dois neurônios para saber que de verdadeira esta competição não teria nada, só o nome, arrancado do modo mais vil do seu próprio corpo e da sua própria alma.

 

 

 

 

 

 

 

 

Colunista: LuA Linhares

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